Paulo Guedes, assessor economico de Bolsonaro (FSP, 25/02/2018)
180225PauloGuedesBolsonaroFSP
'O governo é muito grande, bebe muito combustível', diz economista de
Bolsonaro
Paulo Guedes defende privatização
radical e diz que candidato vai combater tamanho do Estado
FSP, 25.fev.2018 às
2h00
Ex-capitão
do Exército com posições estatizantes, Jair Bolsonaro conferiu a um
ultraliberal a tarefa de criar seu programa
econômico.
Aos 68
anos, Paulo Guedes tem doutorado pela Universidade de Chicago, instituição que
se tornou o símbolo do liberalismo, alma mater de 29 prêmios Nobel de Economia,
entre eles Milton Friedman, ícone dessa escola de pensamento econômico.
Com uma
próspera carreira na área bancária, ele encontrou no presidenciável um aliado
improvável. Desde novembro, os dois têm tido conversas quinzenais de quatro a
cinco horas sobre temas econômicos. Falam-se com frequência por WhatsApp.
O
presidenciável, segundo Guedes, tem aceito sua receita de
privatização radical, corte de impostos e independência do Banco Central.
Depois de
décadas recusando convites para ingressar no setor público, Guedes, CEO do
Bozano Investimentos, se diz pronto a trocar suas caminhadas diárias pelo
calçadão do Leblon por "aquela confusão lá" (Brasília). Bolsonaro já
avisou que, se eleito, ele será seu ministro da Fazenda.
Folha -
Qual o eixo do programa econômico que o sr. está escrevendo para Bolsonaro?
Paulo
Guedes - A Constituição de 88 previu a descentralização de
recursos. Ela foi imperfeita, porque nós perdemos tempo no combate à inflação.
A morte do Tancredo [Neves, em 1985] foi uma infelicidade. O Tancredo era um
veterano de 1964, quando ele viu a democracia se perder pelo problema
inflacionário. Quando ele vê a inflação subindo, entra dizendo: é proibido
gastar, vou controlar os gastos públicos. Quando nós fomos para congelamento de
preços, Cruzado, esse tipo de coisa, nós nos perdemos, nós fomos na direção da
Venezuela, para a hiperinflação.
Como
fazer na prática?
No
programa do Afif [para presidente, que ele coordenou, em 1989], eu propunha
privatizar tudo. Para zerar a dívida mobiliária, a dívida pública federal
interna.
Vender
patrimônio para pagar dívida é boa política?
É só
fazer a conta: dois anos atrás foram R$ 500 bilhões e ano passado, R$ 380
bilhões de juro da dívida. Bota isso 25 anos. Dava para ter acabado com a
miséria?
Mas
privatizar tudo?
Privatizasse
um pouco que fosse. Vá olhar hoje a despesa pública. Será que valia a pena? Ou
pagar um superavit fiscalzinho, só para não deixar a dívida crescer muito? O
país continua sendo um paraíso dos rentistas e inferno dos empreendedores. Os
impostos subindo, os gastos públicos saindo de 18% do PIB quando os militares
entraram para 45%, quando Lula e Dilma saíram, sendo 38% de impostos e 7% de
deficit. É um governo totalmente disfuncional. O governo é muito grande, bebe
muito combustível. Mas se você olhar para educação, saúde, ele é pequeno. Já
que a democracia vai exigir a descentralização de recursos para Estados e
municípios, o governo federal tem que economizar. Onde? Na dívida. Se privatizar
tudo, você zera a dívida, tem muito recurso para saúde e educação. Ah, mas eu
não quero privatizar tudo. Privatiza metade, então. Já baixa metade da dívida.
Tem clima
para privatizar?
A
pergunta é o contrário: tem clima para não privatizar? Onde começou o mensalão,
Bradesco ou Correios? Onde se acusa o Eduardo Cunha? Caixa, loterias, fundos de
pensão. Onde foi o petrolão? Petrobras. Você vê clima para continuar com as
estatais?
Sempre há
resistência.
Resistência
de quem? O povo brasileiro é contra? Ou será que são vocês [imprensa]? Eu nunca
escutei isso do povo. Eu escutei isso da Folha, de jornalistas tucanos,
petistas...
As joias
da coroa, Petrobras, Banco do Brasil, Caixa, tudo isso é privatizável?
Por que
não pode vender o Correio? Por que não pode vender a Petrobras? E se o mundo
for para um negócio de energia solar? E o shale gas [gás de xisto]? E se o
petróleo, daqui a 30 anos, estiver valendo US$ 8 [o barril]? Você sentou em
cima de um totem, ficou adorando o Deus do óleo. Por que uma empresa que assalta
o povo brasileiro tem que continuar na mão do Estado?
O sr.
fala de corrupção nas estatais, mas a Odebrecht, por exemplo, é privada.
Evidentemente,
há piratas privados e criaturas do pântano político.
Então o
sr. admite que corrupção não ocorre apenas no setor estatal?
Tira o
oxigênio. Já viu alguém do Bradesco corromper alguém do Itaú? Alguém do
"Jornal do Brasil" corromper alguém da Folha? O privado não corrompe
o privado, quando corrompe é preso. Não digo privatizar a qualquer preço, estou
falando de gestão de patrimônio público.
Bolsonaro
tem histórico intervencionista, é ele o indicado para liderar essa agenda?
Tem algum
problema a Dilma ter sido presidente porque foi guerrilheira? Teria algum
problema um sujeito que foi capitão do Exército tentar ser presidente?
Ele se
converteu ao liberalismo?
Tem que
perguntar para ele. Ele me pediu um programa econômico. Esse grau de
intervenção do Estado na economia dá um poder extraordinário. Por que as
pessoas têm medo do Bolsonaro? Será que é porque a máquina de moer na mão dele
deve doer?
O que é a
máquina de moer?
O tamanho
do Estado. O Leviatã.
Ele vai
domar o Leviatã?
A
pergunta é: vocês acham que está bom do jeito que está? Crescimento baixo,
desemprego... Será que depois de 30 anos de social-democracia esse grau de
intervenção do Estado na economia corrompeu, degenerou? Eu acho que sim. A Lava
Jato é uma denúncia disso. É possível fazer uma aliança de centro-direita, onde
em vez de aumentar imposto seja reduzido gasto público? Em vez de criar 150
estatais, como o PT, seja reduzir e privatizar de verdade? Em vez de combater a
inflação só com juros na Lua, fazer a parte fiscal com juro baixo?
Previdência
é a principal reforma hoje?
O governo
fez o teto sem ter feito a casa. O teto cai. A reforma da
Previdência é parte da reforma fiscal. A Previdência tem várias
bombas. Uma é a demográfica, por isso tem que empurrar a idade para cima. Tem a
da desigualdade, entre o sistema privado e o do funcionalismo. Tem uma
terceira, que é a do financiamento. Você deixa 50 milhões sem carteira assinada
para a outra metade poder ter emprego, porque cada emprego custa outro em
encargos. O sistema liberal-democrata é o chileno. Não é repartição, é
capitalização. Não é gestão pública, o governo garante o resultado, mas
terceiriza a gestão, numa nova indústria. É capitalismo na veia. Em vez de o
recurso ser dissipado, é acumulado.
Haveria
uma transição?
Sim. Você
tem que criar para a juventude, liberta pelo menos seu filho. O sujeito tem 18
anos, tem duas opções: carteirinha azul, com proteção da Justiça Trabalhista
etc., entra na velha Previdência. Quer a porta da direita? Carteirinha
verde-amarela. Não tem encargo trabalhista, zero. Se você quer a carteira
verde-amarela, você aumenta a sua empregabilidade, porque você está recusando a
Justiça Trabalhista. Tem outro problema, o sistema mistura assistência com
Previdência. Às vezes o cara não contribuiu, precisa de uma renda mínima, não é
Previdência.
Seria
mantido o Bolsa Família?
Isso se
chama voucher educação. Milton Friedman, 1960 em Chicago. E foi aplicado depois
no Chile. O PT precisa pagar royalties.
O sr.
ouviu críticas por sua aproximação com Bolsonaro?
É
possível a ordem conversar com o progresso? O progresso não é Paulo Guedes, o
progresso são as ideias liberais.
E a ordem
é Bolsonaro?
A ordem é
Bolsonaro. São os valores tradicionais e conservadores. Pode juntar trotskista
com marxista, socialista, social-democrata e fazer governos de coalizão de
esquerda? Pode. É possível uma aliança política entre o liberal econômico e
conservador em costumes? É por aí que pode vir a governabilidade, uma aliança
de centro-direita. É um novo eixo. É mais Brasil e menos Brasília. É não ter
toma lá, dá cá, não ter 40 ministérios.
Dá para
cair para quantos?
Eu sugeri
10. Bolsonaro gosta do número 15.
Como o
sr. trataria a questão dos impostos?
Tem que
simplificar e reduzir as alíquotas. Tem alíquota de 40%, mas o cara é isento. A
de 37,5% e o isento. A Inconfidência Mineira ocorreu quando os impostos
chegaram a 20%. Eu acho que nenhuma alíquota no Brasil podia ser mais de 20%.
Em vez de ter o isento e o de 37%, vamos para o 20%? Paga todo mundo. Tem que
reduzir drasticamente o número de impostos, são 54, quando você soma as
contribuições. Tem que cair para 8, ou 10 no máximo. Agora, você não vai fazer
isso num dia.
Quais?
Imposto
de Renda, IVA, IPTU, poucas coisas. Mas temos que conversar ainda.
O estilo
do Bolsonaro incomoda o sr.?
Ele tem
os valores dele: Deus, pátria, família. "Ah, mas é a favor da
tortura". Ele é realmente, torturou alguém?
Ele elogiou torturador
[Brilhante Ustra].
O Ustra
disse que não torturou ninguém. Quem está falando a verdade, quem não está? E
um dos direitos do parlamentar é o de opinião.
Ele não
se excede?
Todos
nós, né? Você nunca se excedeu? O negócio de não merece ser estuprada
[refere-se a frase dita
contra a deputada Maria do Rosário] eu vi, a mulher estava defendendo um
estuprador. E inverteu, de repente ele era o estuprador. Visivelmente foi um
cara enfurecido, falando algo onde perdeu temporariamente a razão. Conheci
muito políticos de maneiras civilizadas e crápulas de comportamento. E estou
vendo uma pessoa que todos dizem que é bruta, mas que tem demonstrado muita
retidão comigo.
RAIO-X
Idade
68 anos
Atuação
CEO da
Bozano Investimentos
Formação
PhD em
Economia pela Universidade de Chicago
Experiência
Fundador
do Banco Pactual, do Ibmec e do Instituto Millenium; coordenou o programa de
Afif Domingos em 1989
CARTÃO DE
VISITAS
Presidenciáveis exibem economistas como trunfo
Presidenciáveis exibem economistas como trunfo
LUIZ
INÁCIO LULA DA SILVA (PT)
Luiz Gonzaga Belluzzo (Unicamp), Marcio Pochmann (ex-Ipea) e Nelson Barbosa (ex-ministro da Fazenda) estão à frente das discussões do programa petista
Luiz Gonzaga Belluzzo (Unicamp), Marcio Pochmann (ex-Ipea) e Nelson Barbosa (ex-ministro da Fazenda) estão à frente das discussões do programa petista
JAIR
BOLSONARO (PSC)
Além de Paulo Guedes, o economista Adolfo Sachsida, do Ipea, conversa com o candidato
Além de Paulo Guedes, o economista Adolfo Sachsida, do Ipea, conversa com o candidato
CIRO
GOMES (PDT)
O secretário de Fazenda do Ceará, Mauro Benevides Filho, é o principal assessor do pré-candidato para a área econômica
O secretário de Fazenda do Ceará, Mauro Benevides Filho, é o principal assessor do pré-candidato para a área econômica
MARINA
SILVA (REDE)
Apesar de ter havido um certo distanciamento recente, o economista Eduardo Giannetti da Fonseca (Insper) segue auxiliando a ex-senadora na área
Apesar de ter havido um certo distanciamento recente, o economista Eduardo Giannetti da Fonseca (Insper) segue auxiliando a ex-senadora na área
GERALDO
ALCKMIN (PSDB)
O governador de São Paulo nomeou o economista Pérsio Arida, um dos pais do Plano Real, como coordenador de seu programa econômico
O governador de São Paulo nomeou o economista Pérsio Arida, um dos pais do Plano Real, como coordenador de seu programa econômico
JOÃO
AMOÊDO (NOVO)
O candidato do
pequeno partido conta com a ajuda do ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco
O candidato do
pequeno partido conta com a ajuda do ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco
GUILHERME
BOULOS
O PSOL, que deve lançar o líder sem-teto, tem entre suas referências a economista Laura Carvalho (FEA-USP)
O PSOL, que deve lançar o líder sem-teto, tem entre suas referências a economista Laura Carvalho (FEA-USP)
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